domingo, 30 de dezembro de 2012
A sociedade e os castelos de areia
Antes de apresentar o texto,
presto uma homenagem a Austro Queiróz, meu
amigo e leitor do Blog, que morreu no mês de novembro na França, onde vivia
desde a década de 1980. Ele era pernambucano e foi o fundador do Movimento
Cultural Phênix, que não possui vínculos político e religioso, tendo raízes em
Recife, Porto Alegre e São Paulo, além de cidades europeias. Participo do
Movimento desde 1996 na capital pernambucana, recebendo muitos ensinamentos de
Austro, a quem sempre terei muito de agradecer. Como diz Milton Nascimento: “Amigo
é para se aguardar no lado esquerdo do peito...” E Austro sempre terá seu lugar
especial lá....
Bem, vamos ao texto, pois a vida continua....
Chegando ao fim de 2012, começa-se a elaboração de planos e projetos e coletivos para o ano novo, verificando-se que tal elaboração, por mais simples que pareça, necessita de uma ampla reflexão sobre seu rebatimento no futuro da humanidade, analisando sua interferência na vivência prática das pessoas.
Caso se pergunte que planos
e projetos se tem para o próximo ano, algumas pessoas diriam que são os
melhores possíveis, cheios de harmonia, paz, saúde e de outras palavras
voltadas para o entrelaçamento dos seres humanos numa sociedade fraterna.
Contudo, cabe uma reflexão se
há espaço para uma sociedade fraterna dentro do atual processo de organização de
vida dos seres humanos, que mantêm a divisão de classes sociais, com a
exclusão de uma camada de pessoas impedidas de usufruir dos bens de consumo e
que vivem em estado de pobreza e miséria, decorrentes das mazelas do
capitalismo, sistema que valoriza as pessoas de acordo com seus bens.
Por mais otimista que se queira
ser, não há condições de crer na construção de uma sociedade fraterna com a
atual organização da vida humana, na qual se mantém as desigualdades sociais e práticas
preconceituosas do ponto de vista racial, religiosa, sexual, observando-se que muitas
pessoas se fecham em si, só olhando para seu umbigo, não vendo que há vidas em
seu em torno e que necessitam se juntar aos seus semelhantes para mudar a realidade,
A tentativa de construção de
uma sociedade fraterna dentro do estágio em vigor da sociedade não poderá se
consolidar, diante a manutenção de relações sociais centradas no favorecimento
das desigualdades e na falta de respeito entre os seres humanos, comparando-se aos
castelos de areias erguidos na praia, que são destruídos pela onda do mar, por
não possuírem bases de sustentação, logo não resistem às forças mais fortes.
A mudança de conduta da raça
humana é fundamental para alcançar uma etapa superior das relações sociais,
possibilitando, então, que se possa viver harmoniosamente, respeitando as
diferenças, mas garantindo igualdade de condições de sobrevivência para as
pessoas em cada área do planeta, não se permitindo que ainda haja seres humanos
que morram de fome ou por falta de água.
Esta nova conduta depende de
um novo conceito de ética entre as pessoas, que deve ser centrado no ser e não
no ter, o que poderá contribuir para diminuir o espaço que separa os ricos e os
pobres, juntamente com um relacionamento harmônico com o meio ambiente,
lembrando que a preservação dos recursos naturais fundamental para continuidade
de vida da própria raça humana.
Compreendendo que o ano de
2013 é um grande momento para que se inicie a construção da uma nova sociedade
e para tanto, deve-se colocar em prática o ensinamento da mitologia grega sobre
o pássaro fênix, que “renascia das cinzas”, ou seja, que cada pessoa possa dar
sua contribuição individual e coletiva para que a sociedade renasça das cinzas,
revendo práticas, que levem a uma relação fraterna entre os seres humanos.
terça-feira, 20 de novembro de 2012
Batuque na cozinha., sinhá........ vai ter que querer
Em uma de suas músicas mais
conhecida, Martinho da Vila canta que ”batuque na cozinha, sinhá não quer”, mostrando
como o toque do povo negro não era aceito na época da escravidão, e só ocorria
nas senzalas, escondido da elite branca, que tentava impor a cultura e demais
manifestações europeias em solo brasileiro.
Durante anos, tal prática
permaneceu inalterada, buscando-se a desconstrução de qualquer manifestação de
outras raças, só se aceitando aquelas de origem ocidental, na tentativa de afirmar
a superioridade cultural da raça branca sobre as demais, consideradas como de
segundo ou até mesmo de terceiro plano.
Em rápida análise, chega-se
a constatação que a frase da música de Martinho da Vila permanece atual, ou
seja, a sinhá é simbolizada pela elite e os seguidores de seus pensamentos e
ideias, que teimam em não aceitar as expressões culturais de origem não
ocidental, querendo manter as mesmas afastadas e sem espaço na sociedade, na
tentativa de perpetuar uma supremacia cultural.
As manifestações culturais
de origem afro-brasileira autênticas e sem apelo comercial, por exemplo, não conseguem espaços efetivos nos grandes
meios de comunicações sociais, inclusive chegando a ser objeto de comentários
preconceituosos, principalmente quando se referem às religiões de matriz
africana, apesar de serem aceitas no período carnavalesco, quando se tornam até
atrações.
A situação evidenciada no
tocante as manifestações culturais e religiosas demonstra a necessidade de
mudanças urgentes no interior da sociedade brasileira, já que a discriminação
racial é algo que permanece no dia a dia, mesmo que alguns segmentos neguem tal
situação, tentando esconder uma realidade cruel e desumana.
As raças negra e indígena
buscam superar os obstáculos históricos criados para o reconhecimento e
valorização de suas práticas culturais e religiosas, salientando que as mesmas vêm
procurando dar respostas aos atos de intolerância e a falta de respeito de
determinados segmentos sociais.
Neste contexto, deve ser
combatido o discurso que o povo negro e indígena se mantem como vítimas de um
processo, já que tais povos sempre foram protagonistas de suas histórias ao
longo do tempo, resistindo e lutando contra as práticas discriminatórias da elite
brasileira, mantendo suas práticas culturais vivas e fortes.
É importante salientar que
qualquer manifestação cultural e religiosa necessita e deve ser respeitada,
independente de sua origem racial, pois só assim o Brasil poderá encontrar o
caminho que não haja encobrimento de atitudes intolerantes e preconceituosas.
Apesar da oposição de
determinados segmentos, as expressões culturais do povo negro e do indígena vão
se fortalecendo, indicando que, mesmo contra a vontade da sinhá, o batuque não ficará
restrito à cozinha, mas ocupará espaços diversificados no interior da sociedade
brasileira, representando avanços e conquistas fundamentais para que se viva em
harmonia entre as raças.
sábado, 3 de novembro de 2012
Zumbi e o "Mês da Consciência Negra"
O mês de novembro é
denominado do “Mês da Consciência Negra”, em homenagem a memória de Zumbi,
líder do Quilombo dos Palmares, assassinado no dia 20 de novembro de 1695, lembrando
que aquela comunidade, assim como outros quilombos representavam um local de
luta e resistência da população negra, que não aceitava viver no regime da
escravatura e buscavam organizar um modelo diferente de organização social.
A construção desse modelo se
baseava nas mudanças nas relações política, econômica e comunitária se contrapondo
ao regime colonial da época, o que levou ao crescimento dos quilombos,
notadamente o de Palmares, que resistiu por mais de um século as tentativas de
destruição da elite branca de então, sendo constituído, principalmente, por escravos
e escravas dos engenhos de açúcar.
A morte de Zumbi e o
massacre do Quilombo dos Palmares representam um momento importante da História
do Brasil, servindo de exemplo para lutas posteriores da população
afro-brasileira, que, ao longo do tempo, continuou sendo colocada em segundo
plano até os dias atuais, apesar do fim da escravidão ter ocorrido há mais de
cem anos.
A celebração do “Mês da
Consciência Negra” é uma oportunidade para desmitificar a ideia que no Brasil
há uma “democracia racial”, com igualdade de direitos entre as pessoas,
independente da cor da pele, a qual é defendida pela elite com a propagação
através da mídia conservadora e, infelizmente, possuindo aceitação de
determinados segmentos sociais.
Outra questão que deve ser
desmitificada se refere ao discurso que os casos de preconceito e discriminação
são fatos isolados, o que não condiz com a verdade, pois a população negra vem
passando por atos discriminatórios nas esferas de relacionamento da sociedade
brasileira, apesar de todo aparato legal contra tal prática.
É importante ressaltar que
as atitudes racistas nem sempre ocorre diretamente, se verificando uma
camuflagem através de atitudes sutis, como, por exemplo, um olhar, mostrando
que o preconceito racial é algo que se encontra enraizada nas pessoas, devido,
possivelmente, ao processo histórico de formação do Brasil.
Como forma de combater o argumento
da existência de racismo, são citados os exemplos isolados de pessoas negras
que alcançaram posições de destaques na sociedade brasileira, querendo passar a
ideia que outras poderiam se encontrar em situações semelhantes, o que não é
verdadeiro, pois a maioria da população de origem afro-brasileira não teve e
ainda não tem condições e oportunidades sociais e econômicas para trilharem no
mesmo caminho.
Em contrapartida a tese que
o problema brasileiro é social e não racial, defendida por
alguns segmentos sociais, seria interessante observar a cor das pessoas que
mais sofrem problemas decorrentes das mazelas do capitalismo, ou seja, a
exclusão social atinge em larga escala a população negra, demonstrando que os problemas social e racial estão associados.
A exclusão negra
no Brasil é, portanto, um fato concreto, se
verificando que a mesma permanece nas senzalas que, nos dias atuais, são representadas
pelas favelas, morros e as ruas das cidades, sofrendo preconceito diante
suas manifestações culturais e religiosas, vivendo de profissões e atividades ainda discriminadas por setores da sociedade, entre as quais empregadas(os) domésticas(os), garis e catadores(as) de materiais recicláveis, além de ser o grande contingente de pessoas mortas nas chacinas, principalmente os mais jovens.
Espera-se que, em um futuro
próximo, se possa comemorar o “Mês da Consciência Negra” de forma diferenciada,
havendo espaço para celebrar uma sociedade fraterna e com igualdade verdadeira
entre todas as raças, o que necessitará de um amplo e árduo caminho de mudanças
de postura, quebrando paradigmas e barreiras surgidas desde que o povo negro foi
trazido contra sua vontade da África e começou a formar os quilombos.
quinta-feira, 25 de outubro de 2012
Ética, indo muito mais além.....
Um dos grandes dons de
algumas pessoas é o de transformar determinadas palavras em clichês,
utilizando-as sem que haja um aprofundamento do significado prático das mesmas no
sentido de provocar mudanças nas ações humanas.
Entre tais palavras, uma
merece destaque a palavra “ética”, que, atualmente, compõe o linguajar dos
debates e discursos nas diferentes esferas das relações humanas no Brasil, se
tornando, inclusive, bandeiras de luta de alguns segmentos sociais.
É importante ressaltar que o
presente texto não tem a pretensão de repassar ensinamentos teóricos sobre o
que é “ética”, porém busca efetuar reflexões sobre os efeitos que seu uso
prático, no dia a dia, poderia provocar na vida das pessoas, mudando
comportamentos individuais e coletivos.
Não se pode deixar de
registrar que, recentemente, a palavra “ética” vem sendo ressaltada
constantemente pela mídia brasileira, notadamente as redes de televisão e os
grandes jornais, devido ao chamado julgamento do chamado “mensalão”, o que a
faz repercutir com maior intensidade no meio da sociedade.
Neste contexto, cabe uma
primeira reflexão, será que há ética numa sociedade na qual grande parte das
pessoas pensa a partir de reportagens em televisões e outros meios de
comunicações? Uma sociedade, em que a mídia impõe seus interesses e vontades,
pode se considerada eticamente constituída? Qual ética deve ser falada em ter com
os meios de comunicações sobre a propriedade de grandes grupos econômicos?
Com referência as suas
relações, muitos seres humanos vêm mantendo atitudes diferenciadas daquelas
consideradas “eticamente corretas”, o que se verifica nos atos de
discriminações social, racial, religiosa, sexual, assim como em ações de
intolerância , que chegam a provocar guerras e morte, criando barreiras e
obstáculos que impossibilitam a construção de espaços de convivência harmoniosa
e fraterna.
A falta de ética no seio da
sociedade humana é latente pelo processo de exclusão de uma camada de pessoas,
que vivem sofrendo as consequências de um sistema econômico centrado na
exploração e busca do lucro, conservando o pensamento de que o “ter” é muito
mais importante do que o “ser”, o que deveria ser exatamente contrário.
O processo de exclusão na
sociedade fica evidente na observação do uso dos benefícios decorrentes do
avanço tecnológico da humanidade, verificando-se a necessidade de mudanças
urgentes, norteadas por novos princípios éticos, que proporcionem uma plena
cidadania para homens e mulheres. Os seres humanos não mantém uma postura prática
do ponto de vista ético no seu relacionamento com meio ambiente, ocasionando a
degradação dos recursos naturais de forma acelerada, sem haver uma preocupação
com o futuro de sua própria espécie e das demais ainda existentes na natureza.
Além das questões coletivas,
citadas acima, deve ser lembrado que o uso da palavra “ética” não pode ficar
dissociada de atitudes individuais no dia a dia de cada ser humano, tanto na
defesa de seus direitos como também no respeito as demais pessoas, evitando
sempre a ideia de “tirar vantagem em tudo”, pois se alguém busca tal “vantagem’
sempre significa prejuízos para alguém e para a própria sociedade.
Finalizando, espera-se que haja
transformações éticas na sociedade brasileira e na mundial, que levem a garantia
de igualdade dos direitos e deveres das pessoas, independente de raça, cor, e fé
religiosa, o que, certamente, significará melhores condições de vida em nosso
país e no Planeta.
terça-feira, 10 de julho de 2012
E após a Rio+20?
As
expectativas criadas em torno da aprovação de metas de sustentabilidade na
Conferência Rio+20 não se efetivou na prática, sendo tomadas decisões tímidas,
que pouco ou quase nada irão contribuir para minimizar os problemas atualmente
existentes no Planeta, demonstrando que os chefes de estados não conseguiram
superar as divergências e colocar seus interesses econômicos e políticos em
segundo plano em prol da melhoria das condições socioambientais.
Os
resultados obtidos em tal Conferência se assemelham aqueles de encontros
mundiais anteriores, nos quais os países considerados mais ricos, busca a
manutenção do “status quo”, não permitindo que avancem as proposições voltadas
para reversão do quadro de degradação que atinge a população residente em áreas
vulneráveis, situadas principalmente em países mais pobres.
É interessante
observar que o documento aprovado pelos governantes mundiais é denominado de “O
Futuro que Queremos”, porém não apresenta nem os objetivos de desenvolvimento
sustentável, que só deverão entrar em vigor em 2015, logicamente se forem cumpridas
as agendas definidas na Conferência e vencidos os obstáculos atualmente
existentes.
Diante da
situação, torna-se evidente que, apesar da crise financeira mundial, os
interesses capitalistas continuam sendo mantidos, já que o encontro do Rio de
Janeiro não criou mecanismos suficientes para minimizar a exploração dos recursos
naturais, a destruição da biodiversidade em todo planeta, bem como a exclusão
social de grande parcela da humanidade.
Neste
contexto, o documento final da Conferência Rio+20 não traz esperança para crise
que assola a Terra, se configurando o quadro que os governos não encontrarão
saídas para o problema, sem que a sociedade civil aumente seu foco de atuação
na agenda ambiental, definindo prioridades a serem atingidas do ponto de vista
local e global.
A temática
ambiental deve ser uma apropriação coletiva, cujo debate do tema em qualquer
esfera necessita incluir os efeitos negativos do capitalismo, cujos tentáculos,
que prejudica a qualidade de vida, os recursos naturais e coloca em risco a
continuidade de vida na Terra.
Observa-se,
então, a necessidade de ampliar a mobilização mundial no sentido de reverter o
quadro alarmante que envolve a questão socioambiental na atual conjuntura
mundial, pois não se pode aceitar que em defesa do desenvolvimento de cada país
se mantenha o risco de devastação ora existente em diversas partes do Planeta.
A construção
da agenda ambiental só se efetivará caso os movimentos sociais consigam superar
as divergências existentes sobre concepção de sociedade, defendendo estratégias
comuns para o objetivo maior, que é a implantação de meios sustentáveis de sobrevivência
da espécie humana, englobando temas como trabalho, uso dos recursos naturais,
bem estar social, saúde, educação, lazer, tolerância racial, sexual, política e
religiosa, entre outros.
Finalizando,
ressalte-se que, após a Rio+20, a mobilização da sociedade, com o
fortalecimento da cidadania local e global, é fator prepotente para que os
governos possam construir mecanismos voltados para o desenvolvimento realmente sustentável,
garantindo um Planeta melhor para todas pessoas e não só para uma elite social.
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